terça-feira, 30 de novembro de 2010
Mulheres indígenas condenam produtores “Hollywoodianos”
As mulheres indígenas publicaram carta elaborada no Encontro Nacional de Mulheres Indígenas para a proteção e Promoção dos seus Direitos na cidade de Cuiabá, que aconteceu entre os dias 17 e 19 deste mês, manifestando repúdio e indignação contra reportagem produzida pela ONG religiosa ATINI, exibida no dia 07 de novembro de 2010 em rede nacional e internacional, no Programa do Domingo Espetacular, da emissora RECORD.
No manifesto, as mulheres explicam que “A malfadada reportagem coloca os povos indígenas como coletividades que agridem, ameaçam e matam suas crianças sem o mínimo de piedade e sem o senso de humanidade”.
Veja na integra o conteúdo da reportagem:
Nós, mulheres indígenas reunidas no Encontro Nacional de Mulheres Indígenas
para a proteção e Promoção dos seus Direitos na cidade de Cuiabá, entre os dias
17 e 19 de novembro de 2010, vimos manifestar nosso repúdio e indignação
contra reportagem produzida pela ONG religiosa ATINI, exibida no dia 07 de
novembro de 2010 em rede nacional e internacional.
No Programa do Domingo Espetacular, da emissora RECORD, foram mostradas cenas de simulação de enterro de crianças indígenas em aldeias dos estado de Mato Grosso (Xingu), Mato Grosso do Sul (Kaiowá Guarani) e no sul do Amazonas (Zuruaha), pelos
fatos e motivos a seguir aduzidos:
1. A malfadada reportagem coloca os povos indígenas como coletividades
que agridem, ameaçam e matam suas crianças sem o mínimo de piedade
e sem o senso de humanidade.
2. Na aludida reportagem aparecem indígenas atores adultos e crianças na
maior “selvageria” enterrando crianças.
3. A reportagem quer demonstrar que essas ações nocivas aos direitos à
vida das crianças indígenas são praticas rotineiras nas comunidades, ou de
outra forma, são praticas culturalmente admitidas pelos povos indígenas
brasileiros.
4. Que os produtores do “filme” desconhecem e por tanto não respeitam
a realidade e costumes dos indígenas brasileiros. São “produtores
Hollywoodianos”.
Vale esclarecer em primeiro lugar que a reportagem não preocupou em dizer
que no Brasil existem mais de 225 povos ou etnias diferenciadas em seus usos,
costumes, línguas, crenças e tradições. Essa reportagem negou aos brasileiros
o direito ao conhecimento de que na década de 1970 a população indígena não
chegava a duzentas mil pessoas ao ponto de antropólogos dizerem que no século
XX os indígenas iriam acabar.
Se de fato os indígenas estivessem matando suas crianças, a população indígena
estaria diminuindo, mas a realidade é outra, pois a população naquele momento
em decréscimo hoje chega ao patamar de 735 mil pessoas, segundo censo de
2000 do IBGE.
A reportagem que mostra apenas uma versão das informações, não entrevista
indígenas nem antropólogos que conhecem a realidade da vida na comunidade,
pois senão iriam ver que crianças indígenas não vivem em creches nem na
mendicância. Crianças indígenas são tratadas com respeito, dignidade e na mais
ampla liberdade.
A reportagem maldosa e preconceituosa feriu intensamente os direitos indígenas
nacional e internacionalmente reconhecidos, pois colocar povos indígenas
e suas comunidades como homicidas de crianças é o mesmo que dizer que
certas religiões praticam seus rituais matando suas crianças ou que a população
brasileira em geral abandona suas crianças em creches, nas drogas e na
mendicância se sem com elas se importarem. Mais, seria dizer que pais de classes
médias altas jogam dos prédios suas crianças matando-as e que é comum famílias
brasileiras em geral jogas seus filhos recém nascidos nos lixões das grandes
cidades, ou que os lideres religiosos são todos pedófilos.
Quais são as verdades dos fatos por trás das notícias caluniosas e difamatórias
contras os povos indígenas.
Não seriam razões escusas de jogar a população brasileira contra os povos
indígenas para buscar aprovação pelo Congresso Nacional brasileiro de leis
nefastas aos povos indígenas? Ao dizer que os indígenas não têm condições
de cuidar de seus filhos automaticamente estará retirando dos indígenas a
autonomia em criar seus filhos, facilitando assim a intervenção do Estado
para retirar crianças do convívio familiar indígena entregando-as a adoção
principalmente por famílias estrangeiras.
Na reportagem, o padrão de sociedade ideal é o povo americano, pois demonstrou que a criança retirada da comunidade agora vive nos Estados Unidos da América e até já fala inglês. Sociedade justa, moderna bem-feitora. Seria mesmo a “América” o modelo padrão de sociedade justa apresentado na reportagem? Vale esclarecer que a ONG religiosa ATINI e sua produtora de Hollywood têm sua sede nos Estados Unidos.
Mulheres Indígenas
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